Ao apostar em Boulos, Lula flerta com a polarização

Published On: 21/10/2025 19:11

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A escolha do presidente em fortalecer Boulos em São Paulo sinaliza uma estratégia de poder, mas também reacende divisões que o país ainda tenta superar

Por Janna Machado

A aposta de Luiz Inácio Lula da Silva em Guilherme Boulos como candidato prioritário em São Paulo não é apenas eleitoral — é ideológica e simbólica. Lula tenta consolidar uma aliança de esquerda com rosto jovem e discurso social, mas a jogada carrega um risco calculado: o de reacender a radicalização política que o próprio presidente prometeu conter.

Boulos é um nome forte entre militantes, combativo e carismático, mas também polarizador. Sua trajetória à frente do MTST e sua retórica firme contra o mercado e setores conservadores ainda causam rejeição em parcelas significativas do eleitorado paulista. Lula sabe disso — e mesmo assim dobra a aposta.

O gesto de apoio é um recado interno e externo: dentro do PT, é um sinal de que o presidente busca renovar a esquerda com novos rostos; fora do partido, é um desafio aos grupos que tentam retomar espaço político após o bolsonarismo. A mensagem é clara — Lula quer o protagonismo da narrativa progressista, mesmo que para isso precise tensionar o ambiente político.

Mas há um preço. Ao investir pesado em uma candidatura marcada por confronto ideológico, Lula pode empurrar o debate público de volta para o terreno da emoção e do embate, onde a racionalidade política perde espaço. É o combustível perfeito para o discurso de antagonismo — e o Brasil, cansado de extremos, pode reagir mal a mais um ciclo de confronto.

Há um paradoxo nessa decisão: Lula, que busca o diálogo institucional e a reconstrução da estabilidade, agora estimula uma liderança que vibra no mesmo tom combativo que ele próprio tenta domar no Congresso. É como acender o fósforo dentro do barril que se quer apagar.

No fundo, o que está em jogo não é apenas uma eleição municipal — é a disputa pelo futuro da esquerda brasileira. Boulos representa a renovação de um campo político que precisa sobreviver além de Lula. Só que, se essa transição for feita com base em radicalismos, o resultado pode ser o oposto: um país ainda mais dividido e uma esquerda refém da retórica que prometia transcender.

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