Piloto acusado de transportar 400 kg de cocaína é absolvido por falhas em abordagem policial
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Justiça Federal anula provas por entender que operação não seguiu os trâmites legais; aeronave havia sido interceptada com grande quantidade de droga no interior de São Paulo
Wesley Evangelista Lopes, piloto detido em flagrante no fim de 2024 com cerca de 400 quilos de cocaína a bordo de um avião de pequeno porte, foi absolvido pela 2ª Vara Federal de Araçatuba (SP). A decisão gerou repercussão nacional, especialmente pela quantidade expressiva de droga envolvida na apreensão e pelo histórico do acusado com o tráfico aéreo de entorpecentes.
A interceptação da aeronave Embraer EMB-720C Minuano ocorreu no aeroporto de Penápolis, no interior paulista. De acordo com a Polícia Federal, havia um forte indício de que a aeronave vinha sendo utilizada como meio de transporte regular de entorpecentes. Dentro do avião, os agentes encontraram diversos pacotes com cocaína pura, escondidos sob o piso da cabine.
Apesar das evidências físicas, a Justiça Federal entendeu que houve irregularidades graves na forma como a abordagem foi conduzida. A operação foi realizada sem mandado judicial, sem relatório de inteligência que justificasse a urgência da interceptação e sem documentação que apontasse uma investigação formal anterior à ação.
De acordo com a decisão, assinada pelo juiz federal da 2ª Vara de Araçatuba, a atuação dos policiais violou o princípio da legalidade e da inviolabilidade do domicílio – conceito que, segundo o magistrado, também pode se estender a aeronaves particulares. Dessa forma, o juiz considerou que as provas foram obtidas por meios ilícitos e, portanto, não poderiam sustentar a condenação.
Histórico e repercussão
Wesley Evangelista Lopes já era conhecido das autoridades. Seu nome constava em investigações anteriores relacionadas ao tráfico internacional de drogas e ele chegou a figurar na lista de procurados da Interpol. Investigações anteriores indicavam que ele fazia parte de uma rede criminosa especializada no uso de aeronaves para transporte de drogas entre países da América do Sul, com destino à Europa e África.
A decisão judicial causou forte repercussão entre os órgãos de segurança pública. Em nota, a Polícia Federal afirmou que continuará trabalhando dentro dos limites legais para combater o narcotráfico, mas destacou a dificuldade de atuar em casos onde a urgência da ação muitas vezes esbarra na rigidez dos trâmites processuais.
Especialistas jurídicos também se manifestaram. Para o professor de Direito Penal da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Ricardo Almeida, o caso é emblemático. “Por mais revoltante que possa parecer diante da gravidade dos fatos, decisões como essa reforçam que o combate ao crime deve sempre respeitar os limites constitucionais. O fim não justifica os meios”, afirmou.
Recurso e continuidade das investigações
O Ministério Público Federal (MPF) já informou que irá recorrer da decisão. O órgão alega que havia elementos suficientes que justificavam a interceptação da aeronave e que a gravidade do crime exige uma interpretação mais flexível em situações de flagrante.
Enquanto isso, Wesley Evangelista Lopes continua solto e sem restrições judiciais. A aeronave permanece apreendida, e o caso continua sendo investigado no âmbito da Polícia Federal, que busca aprofundar os vínculos do piloto com organizações criminosas transnacionais.
A absolvição reacende o debate sobre o equilíbrio entre a proteção dos direitos individuais e a eficácia no combate ao crime organizado, especialmente em casos complexos que envolvem tráfico internacional e o uso de aeronaves de pequeno porte, modalidade crescente entre organizações criminosas.