Maioria dos fluminenses apoia tratar facções como terroristas
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Pesquisa revela apoio massivo à medida e reacende debate sobre endurecimento das políticas de segurança pública no Rio de Janeiro
Uma pesquisa recente revelou que a maioria dos moradores do Rio de Janeiro é favorável à proposta de classificar facções criminosas como organizações terroristas. O levantamento mostra que 72% dos entrevistados apoiam a medida, enquanto apenas 18% se dizem contra e outros 10% não têm opinião formada. O estudo foi conduzido pelo instituto Quaest, em parceria com a Genial Investimentos, e ouviu 1.500 pessoas em 40 municípios fluminenses.
A pesquisa surge em meio a uma série de operações policiais de grande impacto, que reacenderam o debate sobre segurança pública, criminalidade e o papel do Estado no combate ao poder paralelo das facções. O resultado indica um sentimento de saturação e medo da população diante da violência que há décadas marca o cotidiano do Rio.
População cansada da violência
O apoio à proposta reflete a falta de confiança nas políticas de segurança tradicionais, consideradas ineficientes por grande parte dos moradores. O Rio vive um cenário em que grupos criminosos dominam áreas inteiras, controlam rotas de drogas, cobram taxas de proteção e impõem regras locais, substituindo a presença do Estado.
Segundo dados de segurança pública, mais de 49 mil pessoas vivem em regiões sob forte influência de facções criminosas ou milícias. O controle territorial, aliado à intimidação armada, cria uma realidade paralela em que a lei do crime prevalece sobre a Constituição.
Para muitos fluminenses, tratar esses grupos como organizações terroristas é uma forma de reconhecer a gravidade da situação e ampliar os instrumentos legais para combatê-los. Essa classificação permitiria o uso de leis antiterrorismo, ampliação de penas, rastreamento financeiro mais rigoroso e cooperação internacional em investigações.
O que dizem os especialistas
Criminalistas e analistas de segurança pública apontam que a proposta precisa ser debatida com cautela. Embora o enquadramento como terrorismo possa reforçar o combate às facções, há o risco de excesso de poder estatal ou uso político da lei.
O jurista Luiz Otávio Andrade, especialista em direito penal, explica que o conceito de terrorismo no Brasil é delimitado por lei e não deve ser usado de forma indiscriminada. “O que as facções praticam é crime organizado, tráfico e domínio territorial. Classificar como terrorismo exige cuidado técnico, porque isso altera a natureza do combate e o tipo de punição”, observa.
Por outro lado, há quem veja na medida uma oportunidade de modernizar a legislação e garantir respostas mais duras diante do avanço da criminalidade. “O país precisa reagir à altura da ameaça que enfrenta. O poder das facções já é comparável ao de grupos terroristas em outras partes do mundo”, afirma o coronel da reserva Marcos Paulo Ferreira, especialista em segurança pública.
Contexto político e jurídico
O tema chegou ao Congresso Nacional, onde projetos de lei propõem o enquadramento de facções como terroristas, sob o argumento de que elas atentam contra o Estado e a ordem pública. A proposta ganha força à medida que a população demonstra apoio à ação mais enérgica.
No entanto, o governo federal ainda avalia os efeitos jurídicos e diplomáticos da medida. A Lei Antiterrorismo (13.260/2016) define terrorismo como atos motivados por ideologia, religião ou política que geram terror social. Para enquadrar facções, seria necessário ampliar o conceito, o que exigiria alteração legislativa.
Entre a urgência e o cuidado
O sentimento predominante entre os fluminenses é de urgência e insegurança. A violência cotidiana, os confrontos em comunidades e as notícias de ataques a policiais criam um clima de tensão permanente. A ideia de “enquadrar como terrorista” traduz o desejo de uma resposta firme e rápida por parte das autoridades.
Entretanto, especialistas reforçam que combater o crime exige mais do que leis severas. É preciso investir em inteligência policial, educação, geração de emprego e presença social do Estado, para que a população não fique refém nem da criminalidade nem do autoritarismo.
A pesquisa escancara uma verdade incômoda: o povo fluminense quer segurança, mas também espera coerência e equilíbrio das autoridades. A criminalidade é um inimigo comum, mas o combate a ela não pode comprometer direitos fundamentais.
O desafio, agora, é transformar a indignação popular em políticas públicas efetivas, que recuperem o controle do Estado sobre os territórios e devolvam aos cidadãos o direito de viver sem medo.
Fontes: Quaest / Genial Investimentos / Instituto Nacional de Segurança Pública / Agência Brasil

